Eduardo Chamarelli Iaspeck
Diretor Financeiro da Federação dos Servidores Públicos Municipais no Estado do Rio de Janeiro - FESEP RJ,
Diretor de Organização da Confederação dos Servidores Públicos do Brasil – CSPB,
Diretor Financeiro da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil - CTB RJ, e
Diretor de Relações Internacios do Movimento Sindical do Partido Democrático Trabalhista - PDT
A PEC 32 E A DISPUTA DE NARRATIVAS SOBRE OS SERVIÇOS À POPULAÇÃO!
A PEC 32 (proposta de emenda constitucional) é a proposta de reforma administrativa do governo federal, que atinge diretamente a capacidade de estados e municípios se organizarem, atingindo quase todos os tipos de servidores, menos os únicos privilegiados: militares, magistrados (juízes, desembargadores, ministros), parlamentares (deputados, senadores) e membros do Ministério Público. Sobretudo afeta o atendimento à população, que terá os serviços públicos gratuitos e de qualidade reduzidos ou indisponibilizados, criando um verdadeiro abismo entre os mais ricos, que têm condições de pagar pelo serviço privado, e os mais pobres, que não terão acesso a serviços básicos que hoje o estado disponibiliza.
A perspectiva governista, defendida pelos discursos do Ministro da Economia, Paulo Guedes, e pelo Presidente da República, Jair Bolsonaro, fala de um estado inchado e cheio de privilégios, que esta PEC teoricamente combateria, mas a verdade é que a proposta não acaba com os privilégios da minoria privilegiada que realmente os detêm. A grande maioria dos servidores públicos estão nos municípios e estado, e tem uma média salarial de 2 (dois) salários mínimos, e são estes, que menos recebem, que vão pagar a conta pra exatamente garantir os privilégios de quem fica de fora da PEC 32. A tragédia para a população é ainda maior, pois a proposta desconfigura a prestação de serviços essenciais à população como creche, farmácia pública, saúde e educação. Essa manobra, de fato abre espaço na administração pública das 3 (três) esferas para um modelo de contratação e gestão que privilegia servidores temporários (popularmente conhecidos como cargos de confiança dos políticos), e expõe o estado a processos de corrupção e sangria de recursos públicos. Por isso, a proposta é apelidada de PEC da “RACHADINHA”.
É fácil combater o argumento governista de um serviço público inchado com questões práticas do nosso dia a dia: Tem médicos e enfermeiros sobrando nos hospitais e postos de saúde? Há policiais demais nas ruas e a segurança está sob controle? Estão sobrando vagas em creches e escolas por excesso de servidores e professores? O atendimento ao cidadão nas filas da previdência, do INSS, nas perícias, se resolve rapidamente porque há muitos servidores? Fica óbvio neste ponto de vista que o discurso do governo não cola. O Brasil registrou na última década redução de servidores e, consequentemente, aumento no número de atendimentos, em setores como saúde, educação, creche, bancos estatais e INSS. Isso demonstra uma demanda da população maior que a capacidade do estado em atender a sociedade. O motivo: A política de estado mínimo de Paulo Guedes, que arrasta o Brasil para um cenário de desamparo à população mais carente e mais dependente de serviços públicos e torna possível a privatização em setores antes inimagináveis, como escolas e postos de saúde!
Essa história não é nova, a prática fala mais alto do que a teoria em governos neoliberais. A reforma trabalhista de 2017 foi feita com argumento de criar milhões de empregos! Não gerou e o país passa pelo maior número de desempregados em 48 anos, com menores salários e piores condições de trabalho, e se estabelecendo o sub emprego como única oportunidade, muitas vezes. A justificativa para a reforma da previdência de 2019 era de sobrar mais dinheiro para investimentos! O investimento é o menor em 54 anos! Não acabou com os privilégios da casta de servidores da elite do funcionalismo e ainda impôs regras duríssimas de aposentadoria para a população! Agora, apresentam sobre a Reforma Administrativa a tese de que vai cortar privilégios e melhorar o serviço público. Fica claro que isso nunca esteve no radar do governo e muito menos será consequência de uma proposta que reduz serviços ao cidadão. (Dados da FGV)
Fica evidente que a prioridade do governo Bolsonaro é ampliar os recursos destinados ao pagamento de juros da dívida pública, ou seja, o dinheiro dos impostos do povo brasileiro está sendo destinado a enriquecer umas poucas pessoas e não geram nenhum benefício à sociedade. Aliás, uma dívida pública que ninguém sabe de quanto é, que não tem uma auditoria ou acompanhamento, e que torna o estado brasileiro refém da especulação financeira e do capital estrangeiro. Fica claro no Projeto de Lei Orçamentaria Anual de 2021, que demonstra 53,92% do orçamento do Governo Federal destinado para amortização e pagamento de juros da dívida, enquanto o governo destinou deste orçamento valores ridículos a serviços essenciais a população: Segurança Pública 0,29%, Saúde (em meio a pandemia do Covid19) 2,85%, Educação 2,69%, administração pública 0,7%, defesa nacional 1,95%.
É revoltante saber que a proposta da PEC32 do governo Bolsonaro quer diminuir ainda mais os investimentos em serviços à população para alcançar um mínimo de 60% do orçamento para pagamento de juros de uma dívida que sequer se sabe se existe de fato. Não menos importante é refletir sobre a política de privatização de bens como os poços de petróleo do Pré-sal, que tinham, por força de lei, todo lucro destinado à pesquisa, saúde e educação, o que no mínimo dobraria esses investimentos, promovendo um salto de qualidade nestes serviços. Isso é a base de uma política de privatização, que transfere para a iniciativa privada tudo que gera lucro ao estado, e absorve tudo que dá prejuízo a bancos e empresas.
Além do petróleo, setores estratégicos, como energia, casa da moeda, bancos públicos, correios e outras estatais são propositadamente sucateadas com a finalidade de justificar a privatização. Ora, se uma empresa pública dá prejuízo ao estado, por que a inciativa privada que vive do lucro tem interesse? Um bom exemplo da ineficiência da iniciativa privada e da qualidade técnica das empresas públicas, está nos recentes apagões no norte do país, provocados por má gestão de empresas privadas. Se a Eletrobrás não tivesse atuado, as consequências teriam sido ainda mais devastadoras para a população local. Estamos no meio de uma crise energética, com risco eminente de apagões, e a nossa empresa de referência em capacidade técnica neste ramo é da Eletrobrás, alvo da política de privatização da atual gestão governamental, colocando em risco o setor.
No estado do Rio de Janeiro, setores organizados começaram a propor audiências públicas em várias câmaras municipais para levar à população informação sobre os prejuízos da PEC 32. A partir da audiência realizada pela Câmara Municipal da capital, em conjunto com a Assembleia Legislativa do Estado, as audiências públicas contra PEC 32 começaram a enfrentar grandes dificuldades pela reação dos apoiadores do governo, que vem trabalhando contra as audiências nos municípios. Já tivemos várias situações relativas a essas audiências, Como em Nova Iguaçu, onde o presidente da câmara se recusou a colocar o tema em votação; Teresópolis, onde parlamentares mudaram de posição e retiraram pedido de audiência antes de passar pela apreciação, Valença, onde o presidente da câmara tentou impedir a audiência mesmo após aprovação; e Campos dos Goytacazes, onde houve o cancelamento de uma audiência pública já aprovada. Importante neste momento dar nomes aos bois e alertar a população para identificarem claramente quem está trabalhando contra os direitos a serviços públicos gratuitos, universalizados e de qualidade!
Para piorar a situação no estado, o Governador Cláudio Castro, apoiador de Bolsonaro, a mando do governo federal, enviou esta semana para a Assembleia Legislativa nova proposta de Regime de Recuperação Fiscal, que atinge servidores estaduais e setores já muito carentes, como a saúde e a segurança pública.
Vale destacar que os servidores de todo o país estão com salários congelados por força da PEC 186 do governo Bolsonaro, aprovada no início do ano, que impõe um congelamento salarial aos servidores públicos até o ano de 2036. Algumas categorias já estão a 4 (quatro) anos congeladas. Quando esses fatores se somam, o cenário para os próximos anos será de esvaziamento no quadro de servidores estáveis de prefeituras e demais órgãos públicos, que terão estes espaços tomados por correlegionários políticos, cabos eleitorais e afins. O cidadão que puder pagar pelo serviço, será atendido, o que não puder, como disse Bolsonaro, que procure outro presidente para votar!
Quem apoia a PEC 32, vota contra o povo!